Renato Rovai é
jornalista, mestre em comunicação, editor da Revista Fórum, midialivrista e blogueiro. Atualmente, é também professor na Faculdade
Cásper Líbero. Em um bate-papo realizado durante o Fórum #OndaCidadã10,
realizado entre os dias 24 e 27 de julho de 2013, na Fundação Casa Grande em
Nova Olinda-CE, ele concedeu uma entrevista ao radiotube.org.br. Rovai falou
sobre o evento e versou em relação ao atual contexto de mobilizações globais a
partir da internet.
André Lobão:
Qual é a sua avaliação sobre o #Ondacidadã10?
Renato Rovai: Foi
um encontro bastante interessante. Eu acho que a seleção das pessoas realizada
pelos curadores, entre eles o Fabio Malini, professor da Universidade Federal
do Espirito Santo foi muito feliz. Eles acabaram trazendo projetos que
dialogam, mas que ao mesmo tempo tem muitas diferenças de concepção, de
estágios em que estão. E isso acaba permitindo uma troca de conhecimentos que
faz avançar em busca de novas ideias. Vale a pena destacar isso. Não trouxeram
só os iguais para o mesmo lugar.
André Lobão: Essa
diversidade vai levar a algum ponto em comum?
Renato Rovai: Eu
não me preocupo muito com pontos comuns. Eu acho que isso é uma coisa da
cultura hacker que eu valorizo. Você precisa estar muito preocupado com o
processo, mais do que com o produto em si. Se você se preocupa mais com o
produto, você perde o “time” mais interessante. Recorro àquela propaganda em
que os garotos estão subindo uma montanha, cansados. Ficam horas e horas
subindo esgotados. E quando chegam lá olham e um diz ao outro: “E aí, beleza,
vamos agora descer?” Então, você percebe que é preciso estar pensando que o
processo também é interessante. Eu acho que esse processo de reunião vai
melhorar a capacidade de cada um em proporções distintas. Uns vão aproveitar
mais e outros menos. O Eduardo, que esteve presente no fórum, é um guri que tem
15 anos que está vivendo uma experiência muito nova. Ele é um blogueiro da
Rocinha, que tem um blog chamado “Geral Conectado”. Esse rapaz conviveu com
pessoas mais experientes, mais velhas e com outras histórias. E isso vai ser
fundamental para ele no desenvolvimento de seu projeto.
André Lobão:
Renato, você é um ativista que acompanha toda essa movimentação, é antenado,
acompanhou os protestos na Europa, Revolta Árabe... Como você avalia esse
caldeirão global que agora tem o Brasil incluído?
Renato Rovai: Esse
processo tem muito a ver com esse formato de rede distribuída, que é a lógica
dinâmica da internet. Nossa história de rede é anterior à essa de rede
interconectada. Os índios já tinham a deles, os sindicalistas quando faziam um
movimento já trabalhavam com essa dinâmica. Você imagina que existiam as
comissões de fábrica se organizando localmente. O líder ia para as reuniões do
sindicato, trazendo ali o que era discutido nas comissões. Então sempre ocorreu
essa dinâmica. Só que agora temos um processo de interconexão de multidões,
isso que é o diferente. Eu costumo brincar com uma situação peculiar que
aconteceu na minha família, quando descobri a força da rede interconectada.
Isso ocorrei no dia que minha filha fez 14 anos. Hoje ela está com 22. Na época
ela colocou um post no Orkut falando sobre a comemoração do aniversário, e
disse que quem quisesse ir poderia comparecer. E foi muita gente. Ou seja, nem
todos eram amigos diretos dela. Provavelmente, alguns garotos daqueles que a
seguiam, acabaram por compartilhar com os outros amigos. Que por sua vez
convidaram outros amigos. Essa é à força dessa nova rede. Você pode ter uma
pessoa que é um ponto menor, que você julga como pouco influente, e de repente
se ela faz uma coisa interessante pode acabar viralizando isso e chegar às
multidões. Então, muito rapidamente ela pode ter uma força de impacto na
sociedade. É o que está acontecendo hoje no Brasil, de alguma forma. Mas só
acontece quando aquilo que está sendo compartilhado e debatido tem expressão na
sociedade real.
O Facebook não
faz nada, quem faz somos nós que estamos lá dentro. Tem gente atuando
como robô lá dentro? Tem. Mas esse “robô” não transforma nada em viral se não
tiver dado uma densidade real à mensagem. Se as pessoas não quiserem replicar,
aquela mensagem não tem sentido algum. Isso que está acontecendo no Brasil é
muito da expressão desse fenômeno, que é a sociedade informacional. O que você
come hoje, um produto agrícola, por exemplo, tem relação com a sociedade
informacional e não mais com a sociedade industrial. Não é mais o trator que
produz o teu alimento, é o computador que desenvolve as pesquisas desenvolvidas
a partir das sementes transgênicas, defensivos agrícolas e tal, a partir de um
“x” ou “y”.
Então, esse
processo informacional está modificando todas as relações de forças na
sociedade que produz movimentos com essas características: fragmentada em
múltiplas pautas, que são mais horizontais e sem grandes lideranças. E esse é
momento que o Brasil vive essa experiência. Nós podemos sair dela mais fortes
do ponto de vista democrático. Eu lembro que lá no Egito derrubaram o Mubarak
que estava no poder há mais de 40 anos. Depois elegeram o Mursi que não deu
conta do recado e o derrubaram também, e agora chegaram os militares que também
não vão ficar muito tempo no poder. Na Espanha, o Partido Socialista Obrero não
cumpriu o contrato que assinou com os seus eleitores e, por isso, não se
reelegeu. O Partido Popular foi eleito e vai perder as próximas eleições. É o
que todos os analistas espanhóis estão dizendo. Porque não fizeram valer o
discurso. Hoje temos uma crise das instituições mediadoras que tem a ver com a
democracia representativa.
André Lobão: para
encerrar o nosso papo, fale um pouco da revista “Fórum” e os planos para o
futuro...
André Rovai: A
Fórum também precisa se reinventar nesse contexto. Não posso ficar fazendo uma
revista do mesmo jeito, depois de tudo que aconteceu. Não posso mais continuar
distribuindo a revista com um modelo da Chinaglia (distribuidora), que te
coloca em uma situação de estrangulamento no processo de chegada aos leitores.
Nós precisamos pensar novos modelos para inaugurar um novo tempo nas
publicações. Nós já fazemos coisas bastante conectadas com esse tempo. Já trabalhamos
com o Creative Commons, disponibilizamos todo o nosso conteúdo na internet,
nossa relação com os parceiros é de interatividade e abrimos o nosso código
para quem quiser. Pode perguntar que não tem problema, informamos tudo! Enfim,
não temos um formato Coca-Cola, mas precisamos avançar e ter mais pessoas
conectadas na nossa proposta de trabalho e produção de conteúdos.
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